A febre reumática (FR) é uma doença aguda caracterizada por resposta autoimune decorrente de faringite causada pelo Streptococcus pyogenes, também conhecido como estreptococo beta hemolítico do grupo A.
Além dos fatores ambientais, também há um componente genético associado ao desenvolvimento da doença.
Após a infecção, ocorre um período de latência de 2 a 3 semanas, no qual o paciente permanece assintomático até o surgimento das manifestações clínicas da FR.
A doença afeta principalmente as articulações, o coração e o sistema nervoso central (SNC). Acomete principalmente crianças entre 5 e 15 anos, sendo raro após os 30 anos.
Em razão da melhoria nas condições de moradia e assistência médica, atualmente a FR é rara nos países desenvolvidos. Entretanto, no Brasil, continua sendo um importante problema de saúde pública.
Sintomas/manifestações clínicas
As manifestações clínicas mais comuns são febre e artrite, mas a manifestação mais grave é a cardite, pelo risco de evolução para cardite reumática crônica e óbito.
Classicamente, a artrite é caracterizada como uma poliartrite de grandes articulações, assimétrica, migratória e autolimitada, com duração menor que quatro semanas, mesmo sem tratamento específico. Além disso, apresenta boa resposta aos anti-inflamatórios não hormonais.
O acometimento cardíaco se dá, predominantemente, no endocárdio. Na maioria das vezes, ela ocorre associada à artrite e em seguida à coreia. As principais valvas afetadas são a mitral e a aórtica, sendo comum a associação de ambas. Na fase aguda, a lesão é de insuficiência valvar e na fase crônica, ocorrem lesões estenóticas.
A coreia de Sydenham é a manifestação neuropsiquiátrica da FR. Apresenta um longo período de latência (2 a 4 meses). Ocorre em 15% dos pacientes e tem predomínio no sexo feminino. Apresenta forte associação com cardite clínica ou subclínica.
Ocorrem movimentos involuntários, arrítmicos, breves, com acometimento principal das extremidades e da face, que desaparecem durante o sono. Pode haver ainda alterações na escrita, marcha, disfagia, tiques e hipotonia muscular. Usualmente é uma manifestação autolimitada, com remissão espontânea com 3 semanas.
Dentre as manifestações mucocutâneas, que ocorrem em aproximadamente 10% dos pacientes, os principais são: eritema marginado e nódulos subcutâneos. O eritema e caracterizado por um rash macular, evanescente e não pruriginoso e os nódulos são firmes, móveis e indolores.
Diagnóstico
A cultura de orofaringe é o padrão ouro para diagnóstico de infecção pelo estreptococo. No entanto, esse exame apresenta baixa positividade e não diferencia o estado de portador são.
Os testes sorológicos mais usados são a antiestreptolisina O (ASLO) e anti-DNase B. A ASLO eleva-se no final da primeira semana, mas até 20% dos pacientes não cursam com a elevação de seus títulos.
Outros exames complementares são: eletrocardiograma, ecocardiograma e radiografia de tórax, para investigação principalmente do acometimento cardíaco. Hemograma e provas inflamatórias também auxiliam na busca pelo diagnóstico.
Os critérios de Jones modificados em 2015 auxiliam na classificação do paciente com suspeita de febre reumática aguda. A exclusão de outros diagnósticos diferenciais também deve ser feita.
Tratamento
O melhor tratamento para FR é a profilaxia primária, que se baseia no diagnóstico precoce e no tratamento adequado das infecções estreptocócicas de orofaringe, idealmente nos primeiros 8 a 10 dias, pois sua persistência por mais de uma semana desencadeará, nos indivíduos suscetíveis, um processo imunológico com formação de autoanticorpos e instalação da febre reumática aguda.
A amigdalectomia não altera o curso natural da doença, não devendo ser sugerida como conduta de rotina.
- Profilaxia primária: Penicilina G benzatina 1.200.000 unidades em dose única
- Tratamento de manifestações clínicas (a depender da manifestação): anti-inflamatórios, corticosteroides via oral, ácido valpróico, haloperidol
- Profilaxia secundária: Penicilina G benzatina 1.200.000 unidades a cada 21 dias
Categoria | Duração após último ataque |
Febre reumática com lesão valvar residual moderada a grave | Até os 40 anos ou por toda a vida (após cirurgia valvar por toda a vida) |
Febre reumática com cardite prévia, insuficiência mitral leve ou resolução da lesão valvar | Até 25 anos ou 10 anos do último surto (vale o que cobrir mais tempo) |
Febre reumática sem cardite prévia | Até os 21 anos ou 5 anos do último surto (vale o que cobrir o maior tempo) |
Devo fazer profilaxia de endocardite bacteriana?
A profilaxia é preconizada, apesar dos estudos serem conflitantes. Está indicada quando houver manipulação dentária com sangramento, cirurgia ou instrumentação de vias urinárias, trato respiratório ou gastrointestinal. Recomenda-se amoxicilina 2g dose única, via oral, 30 a 60 minutos antes do procedimento.
CID: I 01.8; I 01.9; I 01
Livro da Sociedade Brasileira de Reumatologia. José Tupinambá Sousa Vasconcelos. 2019
Reumatologia: Diagnóstico e Tratamento. Marco Antonio P. Carvalho. 5ª edição 2019
Reumatologia. Marc C. Hochberg. 6ª edição
UpToDate 2021