A Síndrome do Anticorpo Antifosfolípide, também conhecida como SAF, é a trombofilia adquirida mais comum.
Trata-se de uma condição autoimune que aumenta o risco de tromboses arteriais e venosas, podendo afetar qualquer órgão ou sistema do corpo.
Além disso, a SAF também é conhecida por seu impacto significativo na saúde obstétrica, sendo uma das principais causas de complicações gestacionais.
Apesar de ser uma doença séria, a detecção precoce e o tratamento adequado podem melhorar o prognóstico e a qualidade de vida do paciente.
Causas da SAF
A SAF ocorre devido à presença de anticorpos antifosfolípides (aPL) no organismo. Esses anticorpos pertencem a uma família de autoanticorpos que desencadeiam um estado pró-trombótico, levando ao aumento do risco de formação de coágulos.
As principais consequências são:
- Tromboses venosas ou arteriais recorrentes: podem acometer vasos de diferentes calibres e localizações.
- Complicações gestacionais: incluem perdas fetais, abortos recorrentes e insuficiência placentária.
Sendo assim, a SAF é uma doença autoimune que pode se apresentar de forma primária (isolada) ou secundária, geralmente associada a outras condições autoimunes, como o lúpus eritematoso sistêmico.
Manifestações clínicas da Síndrome do Anticorpo Antifosfolípide
A SAF apresenta uma ampla variedade de manifestações clínicas, que dependem principalmente da localização, do tipo e do calibre do vaso acometido. Os sintomas mais comuns incluem:
1. Trombose venosa
A trombose venosa profunda (TVP) é a manifestação mais frequente da SAF, principalmente na circulação venosa dos membros inferiores. Ela pode ser acompanhada de embolia pulmonar, uma condição potencialmente grave.
2. Trombose arterial
As tromboses arteriais afetam mais comumente a circulação cerebral, resultando em acidente vascular encefálico (AVE) ou ataque isquêmico transitório (AIT). Essas condições são causas significativas de manifestações neurológicas, especialmente em pacientes jovens, muitas vezes sem os fatores de risco tradicionais para doenças cardiovasculares.
3. Complicações obstétricas
A SAF tem grande impacto na saúde materna e fetal, podendo causar:
- Complicações maternas:
- Eclâmpsia e pré-eclâmpsia;
- Síndrome HELLP (uma condição grave durante a gestação);
- Acidente vascular encefálico no pós-parto;
- Morte materna.
- Complicações fetais:
- Abortos espontâneos e perdas fetais, principalmente após a 10ª semana de gestação;
- Crescimento intrauterino restrito;
- Nascimentos prematuros devido à insuficiência placentária.
A perda fetal intrauterina a partir da 10ª semana de gestação é considerada uma manifestação característica e preocupante da SAF.
Saiba mais: Síndrome do Anticorpo Antifosfolípide na gravidez
4. Outras manifestações clínicas
Além das tromboses e complicações obstétricas, a SAF pode causar:
- Hematológicas:
- Trombocitopenia (diminuição do número de plaquetas);
- Anemia hemolítica.
- Dermatológicas:
- Livedo reticular (manchas arroxeadas na pele em forma de rede);
- Livedo racemoso (forma mais grave de livedo);
- Fenômeno de Raynaud;
- Úlceras vasculíticas.
- Ortopédicas:
- Necrose avascular ou osteonecrose (principalmente em quadris e joelhos).
- Cardíacas, hepáticas, renais, pulmonares e oftalmológicas:
- Esses órgãos também podem ser acometidos, causando uma série de complicações sistêmicas.
Diagnóstico da Síndrome do Anticorpo Antifosfolípide
O diagnóstico da SAF exige atenção a critérios clínicos e laboratoriais bem definidos. Ele deve ser considerado em situações como:
- Tromboses arteriais ou venosas recorrentes.
- Perdas gestacionais repetidas ou prematuridade causada por complicações obstétricas, como pré-eclâmpsia grave.
- Manifestações clínicas sugestivas, mesmo que não sejam critérios formais, como livedo reticular, alterações valvares cardíacas, enxaqueca e convulsões.
A SAF pode ser classificada como:
- SAF primária: quando ocorre isoladamente, sem associação a outras doenças autoimunes.
- SAF secundária: quando está associada a condições autoimunes, sendo o lúpus eritematoso sistêmico a principal.
Critérios diagnósticos
Para suspeitar do diagnóstico, o paciente deve passar por uma avaliação médica, onde será avaliada a presença de pelo menos um sintoma clínico documentado e uma alteração laboratorial dentro do período de até 3 anos do critério clínico.
1. Trombose vascular
- Um ou mais episódios de trombose arterial, venosa ou de pequenos vasos em qualquer órgão ou tecido.
- O diagnóstico deve ser confirmado por exame de imagem ou histopatologia.
- Importante: vasculite deve ser excluída.
2. Morbidade gestacional
- Uma ou mais mortes de fetos morfologicamente normais com mais de 10 semanas de idade gestacional (comprovadas por ultrassom).
- Nascimentos prematuros de fetos normais antes de 34 semanas, causados por eclampsia, pré-eclâmpsia grave ou insuficiência placentária.
- Três ou mais abortamentos espontâneos antes de 10 semanas, desde que excluídas causas maternas anatômicas ou hormonais, bem como causas cromossômicas paternas ou maternas.
3. Outros critérios
- Plaquetopenia < 20.000
- Alterações de válvulas cardíacas
- Presença de livedo, hemorragia pulmonar, nefropatia da SAF, vasculopatia livedoide.
Os seguintes exames devem ser realizados em duas ocasiões diferentes, com intervalo mínimo de 12 semanas, para confirmar o diagnóstico:
- Anticoagulante Lúpico (LAC)
- Anticorpo Anticardiolipina (ACL)
- IgG e/ou IgM em títulos moderados a altos (acima de 40 GPL ou MPL), detectados por ELISA padronizado.
- Anticorpo Antibeta-2 Glicoproteína I
- IgG e/ou IgM presentes no plasma, detectados por ELISA padronizado.
O diagnóstico adequado exige uma análise criteriosa desses fatores, combinando a avaliação clínica detalhada com exames laboratoriais específicos.
Tratamento da Síndrome do Anticorpo Antifosfolípide
O tratamento da SAF é essencial para prevenir complicações graves, como tromboses e perdas gestacionais recorrentes. Apesar de muitos avanços, ainda existem questões sem resposta definitiva sobre a melhor abordagem terapêutica. O manejo varia conforme as manifestações clínicas do paciente, mas medidas gerais e específicas devem ser seguidas.
Medidas gerais
Todos os pacientes diagnosticados com SAF devem adotar estratégias para controlar fatores de risco cardiovascular e trombótico, como:
- Controle de peso: combate à obesidade.
- Redução de colesterol: tratamento de dislipidemia.
- Cessação do tabagismo: fundamental para reduzir o risco de trombose.
- Tratamento de hipertensão arterial e diabetes mellitus.
Além disso, é contraindicado o uso de contraceptivos orais à base de estrogênio e de terapia de reposição hormonal em pacientes com SAF, devido ao aumento significativo do risco de trombose.
Tratamento específico: anticoagulação
A anticoagulação é o pilar do tratamento para a SAF, sendo indicada para:
- Pacientes com história de trombose:
- Medicamentos como varfarina, heparina não fracionada ou heparina de baixo peso molecular são utilizados para prevenir novos eventos trombóticos.
- Em alguns casos, a anticoagulação pode ser combinada com ácido acetilsalicílico (AAS).
- Gestantes com SAF obstétrica ou trombose prévia:
- A anticoagulação com heparina (não fracionada ou de baixo peso molecular) é essencial para reduzir complicações maternas e fetais, além do uso de AAS.
- Mulheres grávidas com histórico de morbidade gestacional atribuída à SAF e positividade para anticorpos antifosfolípides também são candidatas a esse tratamento.
Considerações finais
A SAF é uma doença complexa, mas com diagnóstico precoce e tratamento adequado, é possível controlar seus impactos e oferecer aos pacientes uma boa qualidade de vida.
Se você apresentar sinais ou sintomas compatíveis com SAF, como tromboses recorrentes ou perdas gestacionais frequentes, procure um reumatologista. O acompanhamento médico especializado é essencial para definir o diagnóstico e traçar o plano terapêutico mais adequado.
CID: D68; D68.